No ano passado, o governo brasileiro atualizou a lista de doenças incluindo 165 novas patologias, como abuso de drogas e transtornos mentais como o burnout (conhecido como Síndrome do Esgotamento Profissional).
A lista foi atualizada pouco tempo depois da pandemia da Covid-19 trouxe à tona doenças mentais como ansiedade, depressão e o próprio burnout, mas outra apareceu recentemente: o burnon – conhecido como paixão excessiva pelo trabalho.
O conceito de "burn-on" como um fenômeno distinto do burnout é relativamente recente na literatura científica e no discurso sobre saúde mental no trabalho. Diferentemente do burnout, que tem sido amplamente estudado e discutido desde a década de 1970, o burn-on ainda é um termo menos estabelecido e pesquisado, afirma Joaquim Santini, pesquisador internacional de comportamento, com passagem por universidades como Harvard, nos EUA, e INSEAD, na França.
O termo "burnon" foi definido pelo Dr. Bert te Wildt, psicoterapeuta alemão, e seu colega, o psiquiatra Timo Schiele, em seu livro intitulado "Burn-on: Always on the Brink of Burnout" (Burn-on: Sempre à Beira do Burnout.
Por meio de suas pesquisas e experiências clínicas, identificaram e caracterizaram o fenômeno do burnon como uma condição em que os indivíduos estão constantemente à beira da exaustão e do colapso, mas continuam a trabalhar e a manter uma aparência de produtividade e sucesso, mesmo que estejam enfrentando uma forma mascarada de depressão.
A Síndrome de Burnon se confunde “paixão pelo trabalho”, quando a pessoa sofre pela busca da excelência e por ter a sensação de nunca fazer o suficiente. Quem sofre com burnon acredita ser uma fraude intelectual, mesmo atingindo altos resultados, não consegue encontrar prazer fora do ambiente de trabalho, porque se dedica até o ponto de exaustão para atingir sua própria meta ou a imposta pela empresa.
Pelo sofrimento emocional ser mais ocultado, aparentemente a pessoa está sempre satisfeita em sua ocupação (sublimação) e pouco percebe os prejuízos com sua saúde mental.
O burnon pode levar ao burnout, porque aqueles que sofrem com essa condição tendem a subestimar sua fadiga e fragilidade emocional, ou atribuí-las a fatores não relacionados ao trabalho.
Aqueles que sofrem de "burn on" continuam a se dedicar intensamente ao trabalho, muitas vezes até o ponto de exaustão. No entanto, ao contrário do burnout, esse comportamento é frequentemente elogiado e recompensado no ambiente corporativo, dando a falsa impressão de que o indivíduo está se destacando em suas funções.
Os sinais sutis do "burn on" podem ser facilmente confundidos com dedicação e comprometimento com o trabalho, o que torna esse fenômeno ainda mais perigoso. Aqui estão alguns sinais aos quais as pessoas devem estar atentas:
Workaholismo: A pessoa se torna obcecada pelo trabalho, dedicando horas extras excessivas e tendo dificuldade em se desligar, mesmo durante o tempo livre.
Negligência do autocuidado: O indivíduo começa a negligenciar suas necessidades básicas, como alimentação adequada, exercícios físicos e sono suficiente, em favor do trabalho.
Isolamento social: As relações pessoais e sociais são colocadas em segundo plano, pois a pessoa se concentra quase exclusivamente em suas responsabilidades profissionais.
Irritabilidade e impaciência: O estresse constante pode levar a mudanças de humor, tornando a pessoa mais irritável e menos tolerante com os outros.
Perda de motivação: Apesar de continuar trabalhando arduamente, o indivíduo pode sentir uma diminuição da satisfação e do prazer em suas atividades profissionais.
Problemas de saúde: Sintomas físicos, como dores de cabeça frequentes, problemas gastrointestinais e fadiga crônica, podem ser indicativos de um desequilíbrio causado pelo excesso de trabalho.
Culpa e ansiedade: A pessoa pode se sentir culpada por tirar um tempo para si mesma ou experimentar ansiedade constante em relação às demandas do trabalho.
Perda de criatividade: A exaustão mental pode levar a uma diminuição da criatividade e da capacidade de resolver problemas de forma inovadora.
Dificuldade em dizer não: O indivíduo pode ter problemas em estabelecer limites saudáveis e recusar demandas adicionais, temendo decepcionar os outros ou prejudicar sua imagem profissional.
Falta de tempo para hobbies e interesses pessoais: As atividades que antes traziam prazer e equilíbrio são abandonadas em favor do trabalho.
Reconhecer as diferenças entre burn-on e burnout é essencial para abordar essas questões de forma adequada. Enquanto o burnout requer intervenções para aliviar a exaustão e recuperar o equilíbrio, o burn-on demanda uma mudança de mentalidade e a adoção de estratégias para estabelecer limites saudáveis e priorizar o autocuidado.
Em ambos os casos, é fundamental criar um ambiente de trabalho que valorize a saúde mental e o bem-estar dos funcionários, promovendo uma cultura de respeito, apoio e equilíbrio. Além disso, terapias, atividades de lazer como um esporte ou uma arte, encontro com amigos, férias e até yoga pode ajudar o funcionário a cuidar da saúde física e mental.
Outro ponto é a necessidade de ver essas doenças com um olhar ocupacional, ou seja, mais ligada à gestão de trabalho do que a aspectos individuais.
No nível organizacional, é crucial que as empresas promovam uma cultura de bem-estar e equilíbrio. Isso pode envolver a implementação de políticas de horário flexível, o incentivo a pausas regulares durante o dia de trabalho, a oferta de programas de gerenciamento de estresse e a promoção de um ambiente de trabalho positivo e colaborativo.
*Artigo original da Exame.